A artista norte-americana SZA, em sua obra SOS, álbum de estúdio lançado em setembro de 2022, constrói uma narrativa que aborda a fragilização emocional e batalhas de saúde mental que tendem a afetar mulheres, não apenas por conta de suas experiências afetivas, como também em razão dos obstáculos da existência feminina, afetada pela desigualdade sexual, racismo, classicismo e sexismo. SZA é conhecida por seus trabalhos conceituais que abordam temas como dependência emocional e isolamento. A inspiração para a capa do álbum veio de uma das fotografias mais icônicas da Princesa Diana, na qual ela está sentada solitária num trampolim.
Com músicas como Normal Girl, na qual o eu lírico se trata de uma mulher negra que deseja ser plenamente incluída nas noções sociais de “mulher”, SZA expõe uma outra faceta que por muitas vezes é distorcida, demonizada e torna-se chacota nas produções da indústria cultural: a raiva feminina. Na canção Kill Bill, a artista narra a história de uma mulher que se torna obcecada com o seu ex-namorado, após o mesmo tê-la “substituído” por outra parceira. A personagem desenvolve fantasias h#mic1d4s e profere frases, como: “é melhor estar na cadeia do que estar só”.
O eu lírico de SZA flerta com uma inversão de papéis que choca, ao passo que secretamente conforta. Em uma sociedade na qual há décadas impera uma epidemia de feminicídios, construir uma narrativa na qual é a mulher quem representa perigo para o homem, promove uma sensação de estranheza que nos põe face à como funcionam as relações heterossexuais em nossa sociedade. Como disse um comediante americano: “a questão é que, se você tiver um namorado louco, você vai m#rrer”.
Na narrativa de SZA, quem morre não somos nós. Por conta desse teor quase proibido, obras que produzem um efeito contrário, no qual mulheres não se tornam as vítimas fatais de seus agressores e a revolta feminina passa a ser explorada, têm sido chamadas pejorativamente de “produtos culturais para femcell” (fazendo referência ao termo incell).
Entretanto, o que muitos ignoram, é o fato de que o discurso cultural tem sido masculino há séculos, e durante todo o seu período, mulheres tiveram de sentar-se e assistir à cenas de estupro desnecessárias, pornografia de tortura e enquadramentos que nos retratam como burras, frágeis e dispensáveis. Às mulheres, nunca foi permitida a raiva. Somos doutrinadas desde a infância através da socialização feminina, a mantermos um comportamento dócil, fragilizado e sempre compassivo para com os outros, em especial, para com aqueles que nos menosprezam e exploram. Graças a posturas como essa, inúmeras mulheres padecem de sofrimentos emocionais e psíquicos por não se sentirem no centro de suas próprias vidas.
Por conta disso, resgatar a autonomia sobre a própria vida e perceber-se como agente central, sem a necessidade de aprazer e ser sempre boa, além de promover grandes melhorias em termos de saúde mental, também nos faz perceber que temos o direito a todas as nossas emoções humanamente naturais.
Só uma nota: nós brasileiros somos considerados "não-ocidentais"(non-western). Descobri isso recentemente num fórum de geopolítica enquanto procurava dados sobre Império…