Nas últimas semanas, os atuais lançamentos das artistas Shakira (45) e Miley Cyrus (30) ascenderam nas paradas de sucesso internacionais abordando os relacionamentos de ambas com seus respectivos ex-maridos. Nas canções “Monotonía” e “BZRP music sessions 53”, Shakira narra as agruras de uma relação na qual, além da mesmice e sensação de abandono emocional, deparou-se com uma traição demasiadamente vexatória, na qual o affair de seu ex-marido Gerard Piqué (35), frequentava a sua casa, vestia suas roupas e comia da sua comida. Além da situação narrada pela cantora na composição, há o fato de que ambos são pais de duas crianças pelas quais Shakira até mesmo considerou estagnar a carreira, como exposto em uma de suas entrevistas para o veículo de notícias alemão “Welt am Sonntag”. Entretanto, a paternidade não se exibiu como uma grande problemática para o futebolista Gerard Piqué.
Quanto a artista Miley Cyrus, em seu novo álbum “Endless Summer Vacation”, a canção “Flowers”, com direito à videoclipe gravado na mansão para a qual seu ex-marido Liam Hemsworth (33) levava as amantes, traz consigo perspectivas de superação e reconhecimento de si, após anos de inadequação em um modus operandi abusivo. Ao decorrer da relação, Liam reprimia a cantora, reprovando publicamente os seus comportamentos e fazendo-a sentir-se “inferior” e “vulgar”. Miley Cyrus relata ter “lutado” até o fim por seu relacionamento, tendo insistido em uma possível amizade pós-separação que não resultou.
Em ambos os casos, as cantoras trazem consigo aspectos cruciais nas relações heterossexuais dentro de uma estrutura patriarcal, homens tendem a afeiçoar-se à imagem que é construída para as mulheres, seja esta de “boa moça”, “femme fatale” ou “esposa do lar”. Tais imagens são utilizadas como mecanismo de atribuição de funções que afetam as perspectivas dos homens sobre as mulheres com as quais se relacionam. Em diversos relacionamentos, eles tendem a aproximar-se de mulheres que possuem o potencial para lhes dar o que lhes é ensinado buscar em relações amorosas (s5x0, serviços domésticos gratuitos e amparo emocional incondicional). Nesse contexto, homens não afeiçoam-se pelos indivíduos femininos, mas sim pelo seu valor utilitário, como afirmaram grandes pensadoras feministas radicais tais como Andrea Dworkin (1946 – 2005).
Dessa forma, mulheres tendem a sentir-se isoladas e não completamente atendidas em suas relações, pois o seu valor humano é fracionado e reduzido àquilo que as mesmas podem ofertar e por quanto tempo. Não curiosamente, o fato da cantora Shakira ter sido traída por seu ex-marido com uma mulher mais jovem, recém-saída da adolescência, diz imenso figurativamente sobre a obsessão dos homens pela juventude e pelo senso de “descarte” que se deseja conservar na figura feminina. Em uma estrutura patriarcal, se faz necessário que todas as mulheres sintam-se descartáveis e substituíveis. Afinal, um dos mecanismos de opressão mais vantajosos reside em destruir a autoestima do aprisionado, fazendo assim com que ele internalize a percepção do seu opressor, como podemos perceber em obras tais como “Amar para Sobreviver: Mulheres e a Síndrome de Estocolmo Social”.
No escopo de uma civilização patriarcal, na qual mulheres são doutrinadas à busca incessante pelo afeto masculino e homens aprendem a manter a escassez do afeto como mecanismo de controle, a classe masculina detém o monopólio da afetividade. Nessas condições, independentemente de possuírem fama, sucesso, riquezas e juventude, mulheres encontram-se sempre em débito interno, pois foram socializadas para crer que há um vazio em si que pode ser preenchido e dignificado apenas através da afeição e aprovação masculina. Por conta disso, inúmeras mulheres rendem-se e dedicam suas vidas a homens medíocres que, ao final, não lhes dedicam metade do tempo ou respeito que as mesmas lhes oferecem.
Como afirma a autora Valeska Zanello: “Na nossa cultura, os homens aprendem a amar muitas coisas e mulheres, a amar os homens.”