Written by: Feminismo Raiz Sem categoria

Nem aborto, nem adoção

Na sociedade patriarcal, as mulheres são criadas para sofrer.

Nos últimos dias, o movimento das mulheres recebeu duros golpes no cenário nacional e internacional. Padecemos com a notícia da negação do aborto legal à menina de 11 anos em Santa Catarina e, logo após, com a confirmação do terrível prelúdio da anulação de Roe vs Wade, revogando assim acesso amplo ao abortamento legal nos Estados Unidos. Como adição nefasta, tomamos conhecimento do caso da atriz Klara Castanho, que violada por um homem acabou por vivenciar uma gravidez indesejada e ser exposta por profissionais de comunicação que não possuem compromisso com os mais caros ideais do Jornalismo.

Neste cenário, percebemos como que em um experimento social, que independentemente das ações tomadas pela mulher vitimada, os indivíduos a bombardearão com ataques produzidos a partir de uma perspectiva misógina que impera não somente nas relações sociais, como também no imaginário coletivo. À luz da culpabilização, que sustenta-se apenas na percepção de que mulheres não são criaturas inteiramente humanas, uma menina de onze anos e uma jovem garota de vinte e um, vitimadas por homens e pelo próprio sistema estatal, judiciário e de saúde, se tornam alvos dignos de perseguição, ódio e repúdio social.

A sociedade patriarcal alinhada aos princípios religiosos cristãos, utiliza como subterfúgio uma frágil defesa da vida, que se traduz em um completo anseio pelo controle dos corpos femininos. Afinal, não há pulsão pelo controle da percepção da paternidade, assim como pela ratificação de leis que resguardem financeira e afetivamente os filhos de pais ausentes. O anseio reside no controle dos corpos femininos, pois esse controle produz frutos e denota poder ao Estado, à cultura hegemônica e à religião.

O ódio às mulheres se trata de um dos mais bem-sucedidos mecanismos de controle em nossa sociedade. Pois, se como projeção mulheres tendem a odiar outras mulheres, como martírio, homens exercem o seu ódio através de violências institucionais e demais modalidades, a fim de ratificar o local subalterno para o qual mulheres foram destinadas. A maternidade compulsória, modulação social que direciona mulheres à procriação e ao trabalho do cuidado, se trata de uma das mais poderosas ferramentas desse sistema. Eles desejam controlar nossos corpos e legislar sobre eles. Seja uma menina de onze anos, seja uma jovem de vinte e dois. Seja o aborto, seja a adoção. Eles nos desejam servas.

Mas se lembrem:

“E isto é o que fazemos: nós os assistimos. Os homens. Nós os estudamos. Nós os alimentamos. Nós os agradamos. Nós fazemos com que se sintam fortes ou fracos. Nós os conhecemos bem. Sabemos os seus piores pesadelos, e, com um pouco de prática, é o que vamos nos tornar. Pesadelos.” 

– Margaret Atwood, O Conto da Aia

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Tags:, , Last modified: 10 de agosto de 2022