No escopo de uma sociedade com fortes tendências fundamentalistas religiosas, os discursos em torno dos direitos sexuais e reprodutivos femininos são utilizados como subterfúgio a fim de ocultar as intenções de controle social, domínio econômico e exercício de poder político através das paixões suscitadas pelo extremismo religioso.
No contexto presente, grupos fundamentalistas se valem de seu domínio em espaços nos quais vigora a negligência estatal, como nas comunidades periféricas, ribeirinhas e em áreas tais a assistência social e a educação, para polemizar as suas perspectivas misóginas no intuito de cooptar a compreensão de crianças e mulheres acerca dos direitos sexuais e reprodutivos.
Em um de seus últimos vídeos publicados no canal “O Algoritmo da Imagem”, o pesquisador Senhorita Bira pontuou que parte considerável da população feminina brasileira não apenas é contrária ao aborto, como também desejar a penalização para quem o pratica.
No cenário em que a consciência feminina está cooptada pelo discurso masculino, como poderíamos conceber a implementação e garantia de direitos sem a construção de uma educação feminista — ainda que paralela — e participação política acentuada?
Não sejamos ingênuas, para além do debate em torno das palavras de ordem “criança não é mãe” e “estuprador não é pai”, precisamos debater a disputa de consciência das mulheres e crianças que estão sob o jugo fundamentalista, sendo cooptadas por discursos que servem à sua própria subalternização.
Numa sociedade em que a única fonte acerca do aborto e dos direitos reprodutivos é a retórica cristã, quais conhecimentos mulheres terão a respeito de como funcionam os procedimentos e de como o espantalho fundamentalista serve tão somente para interesses de dominação econômica e social, em nada remetendo sequer à própria espiritualidade? Se faz essencial realizar as perguntas corretas e manter o alvo no cerne da questão.